terça-feira, 23 de setembro de 2008

quanto custa pensar?

Vamos falar sério! Só nesta última semana duas notícias com o mesmo tema no jornal:
  • A inauguração da Telezoom – um espaço para discutir a atualidade, que tem como diferencial “parecer a sua casa” e não uma sala de aula – numa cobertura aqui do lado, na Dias Ferreira.
  • E agora, no domingo, uma coluna do mesmo veículo descreve para nós o projeto londrino “Escola da Vida”, do escritor Alain de Botton – uma escola com a proposta de pensar a vida através de conteúdo “extra-curricular”.
Como você vê, companheiro, o negócio é mundial! Eu, francamente fiquei dividida: metade já queria saber quanto custava “um curso de pensamento”; a outra me repreendia – quanto custa o quê? Guilhermina!... Guilhermina! Só me faltava essa; agora você vai pagar para pensar?

Já vejo seu cenho franzido com essa minha mania de contar o “causo” sem chegar à conclusão. É que vou pensando enquanto vou falando. Um convite, um pedido pra você pensar comigo. Mas, vem cá, isso não é normal? Eu sempre achei normal pensar, questionar, falar, discutir, ouvir, retrucar, divergir, ponderar, re-fletir, concluir... assim mesmo, com reticências... até que alguém ou eu mesma, por algum motivo, reinicie a questão e lá vamos nós tudo outra vez até encontrar algo de-novo... retificar, ratificar. Ter uma posição. Até ter outra. E isso acontecia na sala da minha casa, ou da sua, num encontro na esquina, no pátio da escola, no campus da universidade, na pizzaria aqui perto, no aniversário de alguém, no chope depois do cinema, no final de semana passado na casa de amigos, aqui bem pertinho: na serra ou no mar... e isso era o normal, assim mesmo, com pronome definido.

É verdade, ainda me lembro bem da primeira vez que experimentei a desagradável sensação de ser uma chata. Estávamos reunidos, alguns amigos de sempre e algumas outras pessoas, daquelas que vão e vêm – namorado ou namorada nova; alguém que alguém queria que conhecêssemos e de repente, sem que eu me lembre do rosto do autor (ainda bem), escutei “Ih, papo cabeça?! Ah, não!” O mundo começava a cindir. De um lado, o saber passou a exigir certificados e títulos, senão não merecia crédito, aliás, nem ouvidos. Do outro, e para uma maioria, comédia virou besteirol (para agonia de Brecht); angústia virou “nóia”; contestação, hard rock. A música perdeu letra e poesia. Puro “balanço” – pode ser pop, lounge, techno, hip hop ou funk, vai? Por algum motivo deve falar inglês e cumprir uma das duas condições: ou gritar bem alto, rave, para se dançar até à exaustão ou apresentar-se too much cool, sem fazer barulho, só o suficiente para preencher vazios... sem dar idéia.

Você sabe, já te falei antes, que penso que essa foi a grande força-tarefa; o maior e mais bem sucedido golpe da ditadura – aniquilar o pensamento crítico e autônomo e devastar o sentido dos grupos e dos encontros. A alienação, a solidão e a ignorância são ótimos aliados do oportunismo. Ficou fácil na medida em que as letras foram sendo substituídas pelos números. Rápido não foi mais necessário saber, bastava estar “antenado” às tendências. Ser fashion e up to date.

A
os poucos que resistiram sobrou o confinamento do pensamento, onde cada um se tornou o algoz de si mesmo, marginal por sua própria percepção silenciosa do mundo.

Agora você entende, meu amigo? Entende minha indignação e meu dilema? E aí, Ataulfo, pago ou não pago para pensar em coletivo?

Por favor, saia desse silêncio, um beijo,
Guilhermina

Nenhum comentário: