quarta-feira, 29 de outubro de 2008

manchetes cariocas de pouco valor poético


Há um corpo decomposto na esquina

Sob o olhar entediado do verão

“Farmacêutico ingeriu estricnina”.

Toneleros, confluência com Barão

Há um pênis extirpado na latrina

De um quarto do Motel “Céu de Neon”.

A perícia, pela arcada da assassina,

Diz que a dona é da zona do Leblon.


Vende, o filho de um juiz, a cocaína.

Quando preso diz-se só consumidor.

Quando solto, vocifera que a heroína

É a polícia, sob o sol do Arpoador.


Há uma festa que é regada à adrenalina

Onde o êxtase da morte é adolescente.

Não sabemos mais se o bonde é da colina

Da Rocinha ou da Marquês de São Vicente.


Há um avô que é pai do neto.Tão menina

É a mãe, que é filha e amante do pavor.

Escondeu-se a sete chaves, senda e sina,

Descobriu-se na eleição pra senador.


Há um crime no Rebouças que alucina,

Um seqüestro que horroriza e atordoa.

Um pingüim é recolhido na Marina

E um bebê é abandonado na Lagoa.


Uma jovem, só por não ser feminina,

Foi surrada e estuprada hoje cedo.

São nazistas, são “carecas”, são rapinas,

Que invejam toda a Farme de Amoedo.


Tantas fraudes e o estado se arruína.

A cidade é uma anarquia, um pardieiro,

Volta aos Goytagazes, tribo que abomina

Todo o povo do meu Rio de Janeiro.


Município, outro prefeito lhe domina,

Queira Deus que não lhe cave a palmo, a cova

A elite carioca é albina,

Quer, no breu das trevas, a Cidade Nova.


Desprezávamos a alma suburbana,

Além túnel residia a insanidade,

Não chorávamos seus mortos e seus dramas

Como o pobre pode ter felicidade?


Hoje, enfim fundiu-se Urca e Brás de Pina,

E o Leblon não deve nada à Piedade.

Quando espremo as manchetes matutinas

Choram as mães da Zona Sul dessa cidade!



Ataulfo





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